Macaco-prego e caiararas - Duas espécies distintas


Foto: Eduardo Cezar
Uma pesquisa realizada por diversos pesquisadores especialistas em primatas mostrou que macacos-pregos e caiararas, antes classificados como indivíduos do gênero Cebus, são na verdade de gêneros distintos. Essas pesquisas vem ocorrendo ao longo dos últimos 11 anos, após a publicação do trabalho de doutorado de José de Sousa e Silva Júnior em 2001, onde o mesmo propôs uma divisão destes dois animais em gêneros diferentes, após análises criteriosas.

Os macacos-prego e caiararas existem na América Central, na Amazônia inteira, no cerrado, na caatinga e em toda a mata atlântica, chegando até a Argentina. Nessa extensão variam muito em forma, cor, tamanho, preferências alimentares e comportamento. São primatas marcantes, com um sistema social complexo e capazes de usar ferramentas, uma habilidade rara. Mesmo diante da grande variação entre espécies, até recentemente os especialistas classificavam macacos-prego e caiararas no mesmo gênero, Cebus, e boa parte deles respondia nos registros científicos pelo nome Cebus apella.

Mesmo sendo muito parecidos, novamente foi observada a distinção destes dois gêneros. Estes estudos se deram através da parceria de Jean-Philippe Boubli, Jessica Lynch Alfaro, da Universidade da Califórnia em Los Angeles, Izeni Farias, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e outros colaboradores, que através de novos estudos genéticos e moleculares confirmaram o que foi proposto em 2001 por José de Souza.

Quando estudava o comportamento desses macacos em Caratinga, Minas Gerais, Jessica via diferenças entre eles e os de outros lugares, mas não tinha contexto evolutivo para avaliar de onde elas vinham. “Não sabíamos há quanto tempo os grupos estavam separados ou qual o parentesco entre eles”, conta. Agora o animal que ela estudava se chama Sapajus nigritus, diferente de como era conhecido tanto em gênero como espécie. O pontapé inicial da mudança foi sugerido por José de Sousa e Silva Júnior em seu doutorado, concluído em 2001 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ele propôs dois subgêneros: Cebus para os caiararas, mais esguios, distribuídos da Amazônia para o norte, e Sapajus para os macacos-prego, mais robustos e muitas vezes caracterizados por um topete na cabeça, espalhados da Amazônia para o sul. “Ele foi corajoso em propor a divisão”, avalia Boubli, “mas agora podemos ir além”. Ficou demonstrado que Cebus e Sapajus são diferentes a ponto de serem considerados gêneros distintos embora de tamanho parecido, ambos com pouco mais de 2 quilogramas. 

O mais interessante é que...
Mais especificamente, o estudo recente mostra que as duas linhagens se separaram há mais de 6 milhões de anos – mesmo tempo que separa o surgimento de chimpanzés e de seres humanos a partir de um ancestral comum. A mudança foi aceita pela maior parte dos primatólogos e está na Lista anotada dos mamíferos do Brasil publicada em abril pela Conservation International.

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Porém, como em qualquer meio científico, há contradições contra a divisão proposta. Um pesquisador, Alfred Rosenberger, do Brooklyn College, em Nova York, defende que a divisão dos macacos-prego e caiararas foi apressada e até certo ponto desnecessária. Embora não critique os fundamentos genéticos, ele argumenta que uma repartição exagerada pode criar espécies raras que angariam mais recursos para conservação, mesmo que não se justifique do ponto de vista científico. A discussão envereda mais para o campo filosófico, com base na fluidez do conceito de espécie, que não tem fronteiras definidas.

Ainda assim, os pesquisadores do estudo recente não tem dúvidas quanto ao que publicaram. Uma curiosidade é que a distribuição atual dessas espécies não foi sempre assim, quando houve a separação desses animais à 6 milhões de anos, ambos se concentravam em regiões distintas. Os Cebus (caiararas) no norte e os macacos-pregos (Sapajus) no litoral do país.

O que separou estas espécies foi a formação do rio Amazonas, responsável por criar uma separação norte-sul que isolou os primatas que ali viviam, gerando a ramificação na genealogia que deu origem a Cebus e a Sapajus

Após este processo, cerca de 4 milhões de anos não se sabe bem o que aconteceu. Só por volta de 2 milhões de anos atrás outros grupos de macacos maiores se espalhou pela mata atlântica, mas sem deixar descendentes na Amazônia. Ao mesmo tempo, a ocupação de toda a costa brasileira acontecia rapidamente e propiciou a diversificação de espécies, onde as espécies ao sul puderam alcançar a Argentina (cerca de 700 mil anos atrás) próximo às cataratas do Iguaçu, e rumou para o norte ocupando o cerrado, na região central do Brasil. Em seguida, por volta de 400 mil anos atrás, eles chegaram de volta à Amazônia, onde tornaram a se encontrar com seus parentes mais delicados, que se tinham espalhado pela região norte, em torno dos Andes, e chegado até a Costa Rica, na América Central.

A reinvasão recente da Amazônia pelos macacos-prego é a explicação por sua baixa diversidade por ali em número de espécies, e também a competição que se estabelece entre os dois gêneros que ficaram separados por milhões de anos. Porém, “Os Sapajus conseguem usar uma variedade maior de recursos, como quebrar frutos mais duros”, explica Jessica, sendo assim, quando Cebus e Sapajus estão juntos, como ocorre entre C. albifrons e S. macrocephalus, a densidade dos mais esguios fica reduzida.

Boubli analisou mais a fundo a diversidade genética dos Cebus, em artigo publicado na edição especial da American Journal of Primatology, e mostrou que esses animais pouco estudados abrigam uma enorme diversidade. Para Izeni Farias, responsável pelas análises genéticas, não foi surpresa. “A distribuição é muito ampla, era de se esperar uma grande variação”, afirmou a geneticista, coordenadora de um projeto do Sistema Nacional de Pesquisa em Biodiversidade (Sisbiota) que busca amostrar a diversidade genética dos vertebrados amazônicos.

Digo sempre que a minha maior sorte foi conhecer a Revista Pesquisa Fapesp, pois pude obter muito mais conhecimento em relação às pesquisas científicas realizadas aqui no país em todas as áreas, principalmente por causa da divulgação da revista inteiramente grátis no site da Fapesp (clique aqui e e veja todas as edições da revista). Para confirmar o quanto esta revista é magnífica, veja abaixo o vídeo que foi gravado para demonstrar a separação das espécies à 6 milhões de anos e os estudos atuais acerca destas.


Clique na imagem para ver os detalhes.
Experiente, Boubli diz que os rios como Jaú e Purus separam populações que podem ficar isoladas tempo suficiente para se tornarem espécies diferentes, e ainda complementa, dizendo que nas duas margens do rio Negro (separadas há 1 milhão de anos) existem macacos iguais, porém, será que são espécies diferentes? Com base nos estudos genéticos realizados, Boubli afirma que foi apenas o ponto de partida acerca das espécies de primatas na Amazônia, o que indica que existe a necessidade de novos estudos.

Olhando mais afundo, as dificuldades enfrentadas pelos pesquisadores na Amazônia são maiores, porque a maioria dos estudos etológicos (comportamentais) são realizados em locais de fácil acesso e os animais geralmente estão acostumados com a presença humana. Já na Amazônia essas regalias não existem, os primatas são desacostumados com os humanos, sendo encontrados somente após longas buscas adentro da mata, superando seus obstáculos contínuos. Como os Sapajus são mais comum no Cerrado e outros locais do país, estes são mais estudados que Cebus.

Esse foi apenas um resumo de uma reportagem complexa da Revista Pesquisa Fapesp, clique aqui para ver mais.

Para mais informações sobre estas espécies e o que é relatado neste resumo, veja os artigos:

LYNCH ALFARO, J.W. et al. Explosive Pleistocene range expansion leads to widespread Amazonian sympatry between robust and gracile capuchin monkeys.Journal 
of Biogeography. v. 39, n. 2, p. 272-88. fev. 2012.
BOUBLI, J.P. et al. Cebus phylogenetic relationships: 
a preliminary reassessment of the diversity of the untufted capuchin monkeys. American Journal of Primatology. 
v. 74, n. 4, p. 381-93. abr. 2012.
GARBER, P.A. et al. Experimental field study of problem-solving using tools in free-ranging capuchins (Sapajus nigritus, formerly Cebus nigritus). American Journal 
of Primatology. v. 74, n. 4, p. 344-58. abr. 2012.
LYNCH ALFARO, J.W. et al. Anointing variation across wild capuchin populations: a review of material preferences, bout frequency and anointing sociality 
in Cebus andSapajus. American Journal of Primatology. 
v. 74, n. 4, p. 299-314. abr. 2012.

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